terça-feira, 30 de setembro de 2008

Sigur Ros - Glósóli








Nas últimas noites tenho sonhado muito...não me lembro ao certo do quê...mas mexo-me muito durante a noite, acordo...e volto a sonhar, mas não sou capaz de me lembrar.Talvez a agitação destes dias me deixe anciosa.

Quem me dera que os meus sonhos fossem assim...como os que aqui deixo.

Porque um dia, todos nós já fomos crianças e criámos mundos, e dominámos terras e tivemos o nosso bando...corremos sem fim, amámos da forma mais pura, adormecemos na terra e achámos que era possivel voar...e voámos mesmo.

Se é que ainda não somos assim e continuamos a voar...e a acreditar.

Sou e serei uma eterna criança...



Do exterior para o interior...para o teu quarto.





















As minhas visitas ao hospital, são cada vez mais frequentes, há pelo menos 19 dias que ando nesta rotina.
Aos poucos, vou começando a integrar este trajecto, todos os dias, o caminho até lá, o átrio cheio de gente que chega, que parte, mas sobretudo que espera, os espaços, o mesmo corredor, o elevador, o corredor de novo, e por fim o quarto, a cama, o meu pai, o beijo na testa, o sorriso, e a pergunta: "Como te sentes hoje?"


Aquele quarto,vai-se tornando numa pequena comunidade, onde já nos conhecemos, inclusivé as visitas dos outros doentes.Há ali um sentimento de compreensão.Pois todos eles, com problemas diferentes, sofrem e estão ali fechados.


Já sei um pouco da história de cada um, e há de tudo.


Na cama 1, está um senhor, de 73 anos, a que tem dois dedos do pé negros, os dedos estão mortos, não mexem, não doem, nada, como é diabético pensam cortar-lhe os dedos.O homem está numa aflição tal, que só fala nisso.


Na cama 2, o mesmo quadro, diabético, não fala, dorme sentado, com as pernas penduradas para fora da cama, sem se encostar a lado nenhum, nunca recebe visitas, pelo menos quando lá estou, e tem um pé ligado, que será para cortar.Mas ele tem um olhar, curioso, apesar de não dizer uma palavra, olha muito para nós e observa tudo.Sinto ali um certo abandono...


Na cama 3, um senhor da idade do meu pai,com o mesmo problema de base, que o meu pai, cancro do cólon.Também vítima de um hospital que deixou andar, se fosse assistido a tempo, estava bem melhor.
Ele está sempre acompanhado pela mulher e pela filha, que fazem tudo ao pé dele, quando ele come, elas também comem, para lhe fazer companhia, quando ele vai á casa de banho, fazem-lhe a cama, ajeitam-lhe as coisas, com imenso cuidado.Hoje vi uma cena, entre esta família, que me impressionou muito, ele estava cheio de dores, contorcia-se na cama, e elas uma de cada lado, agarravam-lhe nas mãos, e ele chorava em silêncio, mas podia ver-lhe as lágrimas a cair, a certa altura a filha tira da gaveta, uma pequena cruz de madeira, e mete-lhe na mão e fecha-a.E ali ficaram, até que a enfermeira viesse dar medicação para as dores.Com ele.


Na cama 4, um senhor muito idoso,muito magrinho, mas muito engraçado, do mais cómico que há,na cama junto á janela, ali está, com as suas expressões únicas, todas as enfermeiras gostam imenso dele, o seu problema não sei qual é, mas quando precisa de alguma coisa, seja levantar a cama, seja beber água, eu que estou ali, vou lá e depois agradece sem fim, dizendo: "Muito obrigado, muito obrigado, obrigadissímo, Muito mas muito obrigado, linda menina."Mas tantas vezes, que já eu me sentei junto do meu pai, e ele ainda está a agradecer.Começo a rir-me como toda a gente, porque depois ele fica a cantar baixinho, olhando para a janela.


Na cama 5, um senhor Africano, que era engenheiro civil, fala muito da sua terra, Angola, tem o mesmo problema que o meu pai, mas já foi operado, está a recuperar, dorme a maior parte do tempo, quando recebe visitas, continua a dormitar, não se importando com elas.


Na cama 6, o meu pai.


E não sei bem o que dizer.É o meu pai.


E imaginá-lo ali,falar dele ali, é sempre estranho...o cenário dele, seria mais uma planicíe alentejana, extensa, e doirada...
Ele passa o tempo, de barriga para cima, destapado, olhando muito para o tecto, para longe, faz-me perguntas sobre casa, sobre mim, sobre a vida que corre lá fora, consigo por vezes arrancar-lhe o riso, mas a preocupação que sente, não o deixa prolongar esse mesmo riso.
Conta-me como foi a noite, e quando chega a hora do jantar, custa-me muito estar ali, pois ele não come e não bebe, devido á sonda que está a limpar o sistema.Mas o cheiro da comida invade o quarto.Nós quando não comemos umas horas, ficamos com dores de estômago, eu não quero pensar 7 dias.
A sonda é para ele a sua maior "inimiga", implica muito com ela, pois aleija o nariz e a garganta, e todos os dias me diz, que amanhã é que vão tirar aquilo dali e vai começar a dieta líquida.Mas enquanto a sonda não estiver limpa, não a podem tirar.Mas eu vou-lhe dizendo que tem que ter um pouco mais de paciência, que depois aos poucos vai voltar a comer...e ficar forte, para se poder tratar.Que vai correr tudo bem, que tem que ser ele a querer.


Acaba a visita, e chega para mim o momento mais duro, deixá-lo.
Ás vezes só me apetece voltar atrás...na janela grande do corredor central o sol põe-se lá ao fundo, por trás da serra de Sintra, e eu vou-me lembrando que há sítios tão melhores para o ver pôr-se...mas ali também tem a sua beleza, também conta e há-de marcar.


E assim, se vão passando os dias, sei que o que tenho escrito estes dias, tem sido meio cinzento e são situações em que não há muito a dizer.


Apenas confiar.


É o que fazem as pessoas daquele quarto, daquele hospital, de outros quartos que não sei, de muitos hospitais...do País e do mundo.


Eu também confio, e sei que melhores dias virão, por agora vivo estes, um de cada vez.









(Queria ter uma varinha de condão e curar o meu pai.Tenho uma, que espalha amor, ajuda, mas não chega.
Alguém sabe onde se arranjam aquelas que curam?)





segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Noruega...?

Era, era isto que queria muito fazer contigo...

Do nada, vens tu e desafias-me a mais uma aventura por aqui...daquelas, nossas e antigas...

E eu? Eu não sei o que fazer, agora pelo menos, não tenho cabeça.

Mas ainda tenho coração.

O tempo.Só o tempo.

domingo, 28 de setembro de 2008

Um raio de sol.





No meio de tanto cinzento, um raiozinho de sol, sabe bem.

Este quarteto, dá-me vida.Dá-me essa luz.Um quarteto missionário.

Hoje foi o envio da Susana e da Leonor, para Moçambique.

E ao vê-las, a alegria é maior, o abraço é terno e sentido, saudoso pelo que se viveu.

Por cá, fico eu e a Catarrrrrina, em formação e confiando no caminho que Deus traçou para nós, seja quando for.

O dia foi cheio de reencontros que pertencem a um passado feliz.

Mas olhando para o presente, foi tão bom sentir esta família hospitaleira, que acolhe, e onde nos encontramos, é uma festa!




Hoje vocês foram este raio de sol, que precisava e que bom é estar com vocês.

Obrigado pela força, pela alegria, pela amizade que acaba de nascer, mas espero que perdure, nesta paixão á missão.


São lindas.Pessoas lindas.






(A foto é do campo missionário, com um ar esgotado e ás tantas da manhã...)








Bom depois, fui visitar o meu pai...e lembro-me de entrar por aquele hospital adentro, com uma confiança e uma energia positiva, disposta a fazer com que ele a sentisse.
Esperei 1h no átrio, pela minha vez, o que me permitiu observar o que as pessoas vão sentindo, fazendo, enquanto esperam, desesperam...e de como é duro, enfiar crianças a tarde toda ali.
Entrei por fim, cheguei e encontrei o meu pai um bocadinho melhor, com tudo já a querer funcionar, dentro dele...e fora também.Falamos muito, ele adormeceu enquanto eu fiquei ali, a olhar para ele, a comtemplá-lo.Os seus traços, o seu rosto, o seu ressonar, tudo...
Depois acordou e estava na hora de jantar, o cheiro a comida invadiu o quarto, mas ele não podia comer.Nessa altura até a mim me custou...imagino a ele.Tentei distraí-lo, conversando, mas ele insistia em repetir, que não comia há 6 dias e que não sabia como se ia aguentar.
Aí, tive que lhe dizer que para nos curarmos, temos que fazer sacrificios, por mais que nos custem, também eu já os fiz...e estou bem.Na altura custa muito, mas um dia olhamos para trás e pensamos, que aquele sofrimento nos valeu a vida, e que o dele, vai valer a sua também...por muitos e bons anos...se Deus quiser.
E Deus quer.
Não quer?

sábado, 27 de setembro de 2008



O dia de hoje...



A tarde foi passada no hospital, com um pai, que está todo entubado.Tubos no nariz, tubos, na barriga, tubos nos braços, tubos, tubos e mais tubos.
Não come, nem bebe há 5 dias.E ainda terá que esperar mais alguns dias.
As dores são fortes e o ar cansado, demonstra bem o que sente.
Ainda o fiz rir, com as minhas baboseiras, mas o seu sofrimento é maior e logo nos damos conta disso.
Não sei se sabem o que é, vermos a pessoa que aos nossos olhos era um gigante, e tinha muita força, e nos carregava ao colo e ás cavalitas, deitado numa cama, assim.E nós sem muito poder fazer, para além de estar ali.Estar.
No átrio das visitas, encontro uma ex-colega de secundário, ela chama-me e chegamos á conclusão que estamos ali as duas, pelo mesmo motivo.PAI.
Pai doente, pai que foi vitíma de um serviço de saúde que deixou arrastar, acabamos a conversa num abraço, que me soube bem, pois não o esperava...de todo!Um desejo de força e coragem.
Regresso a casa, dormente por dentro, sem pronunciar uma única palavra.
A noite, reserva-me a companhia de um amigo e do som do mar, para poder talvez chorar a minha dor, respirar, mas quem sabe acabar a sorrir e assim adormecer mais leve.
Mas amanhã...acordo e vejo que isto não é um pesadelo, e começa tudo outravez.
Esta dor é das fundas.

sexta-feira, 26 de setembro de 2008




Longas horas tem um dia...especialmente quando sofremos!


















Indignação.Impotência.Sofrimento.Esperança.


São algumas das palavras, que definem o que estou a sentir neste momento.Bem como toda a minha família.


Sei que reclamar para o mundo, não vai adiantar nada, não trará de volta a saúde ao meu Pai.Mas reclamo aqui, neste meu cantinho, onde sei que sempre tenho voz, e uns olhos atentos que me lêm e fazem força comigo.Sei que lutar contra um hospital, é uma batalha quase sempre perdida...pois um médico é sempre um médico e acha que nunca erra.Mas tenho a certeza que os médicos que têm acompanhado o meu pai, foram para com ele incompetentes, pouco interessados.E porquê?Porque o meu pai não lhes pode pagar 5.000 euros, para ser operado no dia a seguir nas suas clínicas particulares.Logo não lhes interessa.Pode definhar, pode agunizar, que isso, para eles é comum.
E os utentes, confiam neles, como se fossem Deuses, para lhes dar de novo a vida com qualidade, que perderam.


Hospital Amadora-Sintra, este é o local onde nunca ninguém pode desejar cair, eu ousaria talvez em chamar-lhe, de "matadouro" público, onde alguns têm a sorte de se safar, depois da penosa experiência que é um internamento ali.Para não falar nas urgências, que têm tempos de espera de mais de 20h, em pé, nos corredores e sem quaisquer condições.


E falo, falo porque sei, porque infelizmente o meu pai, tem sofrido horrores naquele hospital, e o seu estado agrava-se de dia para dia, porque faz parte de uma lista de espera, de milhares de pessoas, que anseiam uma operação, uma cama, uma vaga...para lutar pela vida.


Ele tem sido um guerreiro, a operação estava prevista para Março, para retirar algo muito simples,que se fosse retirado a tempo, não estaria a espalhar-se por todo o seu corpo desta forma.Já lá vão 7 meses, de espera, de mau estar, de incerteza...e certamente de agravamento visivél aos nossos olhos que o acompanhamos todos os dias.Ainda assim, uma espera esperançosa, um olhar para o futuro e para as coisas que ainda quer fazer no seu alentejo, ao pôr do sol, debaixo das oliveiras...onde eu acredito que ainda sorrirá.


O último internamento durou 15 dias, e ontem teve finalmente alta, mesmo queixando-se de dores e não comer nada nem beber há 2 dias, mas a resposta que obteve foi:"Procure o seu médico de família, não temos camas, e pensamos que a sua situação está estabilizada."


A minha indignação, em saber que a situação estava tão estabilizada, que passado algumas horas de estar em casa, voltou imediatamente para as urgências, com dores, e sem conseguir comer ou beber nada.Na urgência ficou das 17h, ás 5h da manhã, num corredor á espera de ser visto.Finalmente foi observado e encontra-se no S.O (serviço de observação), onde ainda está, pois não há vagas nas enfermarias.


O que dizer disto?O que pensar?O que fazer?


Mas quem manda um doente para casa, sabendo que ele não está bem?


É revoltante, uma pessoa que como ele trabalhou a vida inteira, honestamente, fez os seus descontos, e no fim depara-se com um sistema de saúde que em tudo falha, que não dá vasão, que investe tanto dinheiro, mas que não demonstra quaisquer resultados.


Impotência, por não poder tirá-lo dali, suprimir a sua dor.


Sei, que num hospital como o IPO, quanto a mim o melhor hospital que conheço, apesar de não se novo, mas que dá resposta rápida ás necessidades dos doentes.Ali luta-se todos os dias pela vida, por todos os meios, com todas as forças, quem lá trabalha, não vê só dinheiro, vê as pessoas que trata, e cuida delas, com um amor, dificil de encontrar.Eu sei, porque já recebi esse amor, e já senti na pele essa entrega que salva.Se alguém precisa de ser operado, isso é feito assim que há oportunidade, mesmo que para isso, se opere durante a noite e madrugada, se façam horas extraodinárias...o que importa é salvar uma vida.


É essa a função de um médico...não de arrastar as coisas, como se não fosse nada com ele.


É porque não sabe a esperança que ainda temos dentro de nós, mesmo que receie que seja tarde demais.


Mais dias de internamento, mais dias com o coração inquieto...mais uma luta.
Mais fé também.Não sei como tenho aguentado estes dias...a nossa força, pode sempre parecer suficiente, mas a certa altura precisamos de um abraço, de uma voz amiga, de perceber que estão connosco, pois o medo também grita dentro de nós.Medo de não saber o que vai acontecer.Mas ainda assim confiar.
.


E é nestas alturas que vemos, quem de facto está connosco.E podemos achar que estamos rodeados de montanhas de pessoas, sim de facto estamos, são as pessoas, que partilham connosco festas, aniversários, saídas, férias,momentos felizes e assim a amizade é muito fácil e não dá trabalho algum...


E então os momentos como este?Não fazem parte da amizade?


Vida.Pois cada um tem a sua.


Pois a vida dos meus amigos importa-me.Preocupa-me.Motiva-me.Alegro-me e choro com eles.
Mas os amigos, revelam-se, ao longo da nossa caminhada, sobretudo nestas alturas e muitas vezes essa palavra de apoio,esse abraço, vem de onde sempre veio, dos portos seguros,que longe ou perto nunca nos deixam ou então de onde não esperávamos que viesse.E surpreende-nos.E aconchega-nos.
Há dias que não podemos esconder a tristeza, e eu todas a noites acendo uma vela, e peço do mais fundo de mim, que tudo acabe bem.














Obrigado a todos os que estão comigo e por isso com o meu Pai, através dos gestos mais simples.No coração.



quarta-feira, 24 de setembro de 2008


Fraguemento de uma leitura...




[...]

Quem te dera teres-lhe este amor. Quem te dera que ele pudesse ser o homem que imaginaste, sempre que não conseguias dormir – sempre.

Ele é bom e é bom para ti mas, quando pensas nele, há sempre um mas.

Só que ele agarra-te pela cintura e fala-te de estrelas e diz que és uma cidade com muitos corações a baterem dentro de ti, que as ruas ensolaradas de Lisboa são como os caminhos do teu afecto, que os teus cabelos negros são as amarras invisíveis que o prendem aqui, que tens nos olhos todo o encanto das tardes de Verão passadas por aí. [...]

terça-feira, 23 de setembro de 2008

Please

Please - Lamb

Já passaram 11 dias, e continuas no hospital.

Esta casa, está demasiado vazia e silenciosa sem ti.

Quando entro em casa, quando me sento á mesa, quando quero rir-me contigo de alguma coisa...

És-me essencial.

Continuo a rezar...com todas as minhas forças.

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Hoje chegou o Outono...












Hoje, digo adeus ao verão e abraço o outono.
Desde míuda, que faço questão de assinalar de alguma forma a chegada de uma nova estação.
É algo mágico para mim...marca algo que ainda não sei.Traz recordações que no entanto, sei de cor...
Gosto das estações intremédias, como a primavera e o outono, pela suavidade com que nos beijam, pelas suas cores...
Na verdade, sei ver em cada uma, o que tem de melhor e tirar proveito disso mesmo.
Esta é das estações do ano, que mais gosto, pode até ser nostálgica, deixando a saudade de um verão cheio e solarengo, mas gosto das suas tonalidades, do seu cheiro a castanhas assadas pelas ruas, gosto das primeiras chuvas, gosto do fresco que cai pela noite e de procurar de novo os agasalhos arrumados na gaveta, gosto de pisar folhas secas e ouvi-las a estalar...gosto até que os dias sejam mais pequenos e sinta por mais tempo o aconhego do lar e o valor da chuva na janela e uma caneca de chocolate quente na mão.Pelas ruas, ouve-se o burburinho dos míudos que regressam ás aulas, entusiasmados...
Sei, que em breve a chegada das estações para mim, será algo que não poderei celebrar, porque não darei pela sua chegada...ou simplesmente porque, onde estiver podem não existir.
E eu, dou por mim a pensar que a vida é mesmo um ciclo, que nunca é igual, na sua essência, apenas na sua ordem.
A essência somos nós...e as cores com que pintamos os dias.
Pinto, pinto, pinto...


domingo, 21 de setembro de 2008

Ponto final.Parágrafo.






Espaço "parágrafo caffé"...Almada,Cais do ginjal...tão parte de nós...
Algumas recordações que guardo daquele cais, voltam.
Ali ao lado fica o "Ponto Final", um restaurante único,pequeno e acolhedor, onde é possivel ter um jantar agradável sobre as águas do Tejo...com a melhor vista sobre Lisboa.










Já no parágrafo, encontramos um ambiente especial,as caracteristicas do bar e a música de fundo, Jazz, tocado pela nova banda do Paulo, assim se fez aquela noite.








A fazer lembrar outros tempos...
Estava pouca gente...e isso, trouxe-me a calma, no fim de um dia agitado.
A noite prolongou-se pós actuação ,facilmente nos deixamos levar por dois dedos de conversa naquele terraço!E o sonho vai longe...tenho a impressão que ali, naquele cais, seja manhã, fim de tarde ou noite, a magia permanece.E há sempre mais a descobrir.
Não deixem de visitar.


Até breve...Ponto final, parágrafo!!!

sábado, 20 de setembro de 2008

Campo missionário

8 a 17 de Setembro

Centro de recuperação de Menores - Assumar - Portalegre






Ainda não me sinto preparada para relatar esta experiência, que em tudo me abanou...mas ficam as imagens e algumas impressões, ainda que ao de leve.



Nunca tinha trabalhado tão de perto e durante tanto tempo, com crianças e jovens portadores de deficiência mental e fisica, profunda e moderada.Foi um desafio que aceitei.
Descobri, que há quem dedique a sua vida inteira a ser mãe e pai destas meninas, com um amor maior que tudo...capaz de abraçar a maior diferença.









Aos poucos fui aprendendo, que são elas que nos ensinam a vida, e que nós nada sabemos...







Porque na sua diferença, há muito de igual, ao que somos...



E para as fazer felizes, bastam gestos tão simples...não exigem, não julgam, amam do seu jeito...auxiliam e são sensivéis a tantas coisas que nós não vemos.

As manhãs eram passadas nas unidades, a ajudar em tudo o que fosse necessário, e as tardes de formação...pela tardinha, voltávamos, para o jantar e deitar as nossas meninas, com o carinho de mães.


Eu e a Catarrriiinnnaa, a minha companheira de missão, que me ensinou muito, me aturou muito e fica para sempre o que partilhámos, partir contigo em missão seria uma alegria enorme.



Um reencontro com o passado, mas num presente muito concreto, a Ana Lucas, que nos foi visitar no dia da missa de envio da sua mana Leonor, para Moçambique.Ela que caminhou comigo durante 4 anos um caminho que me permite hoje, estar aqui, com mais clareza e certeza...




Passagem do testemunho, das meninas que chegaram de Moçambique e das que vão, a Leonor e a Susana.










Um envio, que em tudo teve simplicidade...





A Leonorrra, pronta para partir, com a Tishirt que lhe pintámos, a cruz da missão e a sua capulana com o Badoca.Obrigado pela tua alegria, que contagia...




Trabalhando para dar cor á casa e festejar a vida...por mais dura que ela seja.



Colorindo...

E aqueles corredores encheram-se de cor...


As nossas meninas no pátio, prontas para a festa!


Melhor que o Assumar não há...não há, não há...



Foi a alegria...

Cantar, cantar, cantar...



Depois de uma semana de trabalho e formação, pelas unidades, houve um momento que foi um obrigado, muito simples, ao que elas nos deram...de tão valioso.

E no regresso a casa, ficam os sorrisos missionários e dispostos a dar a sua vida...





Aqueles corredores, permanecem agora no mesmo silêncio, em que os encontrei...e isso custa-me,mas na memória e no coração de todas nós, de quem lá ficou e de quem partiu, está a alegria destes dias...algo que não se explica.Algo que estou certa, ficará para sempre.
Sei que a vida ali dentro, pode ser sempre igual e sem cor, mas em que outro sitio, encontrariam elas um lar?Alguém que as ame, como aquela equipa de, Irmãs, Psicólogos, enfermeiros, educadoras, auxiliares...todos.
Capazes de as aceitar como são, e prolongar a sua vida, com os cuidados necessários...e dignos, como merecem.
Amando-as.Só assim é e foi possivel.











Prometo voltar.
Pelo natal.
Até breve.




(ainda faltam as fotos do badoca parque, onde passámos um dia maravilhoso...)

quinta-feira, 18 de setembro de 2008






Ainda a aterrar...





Há dois dias que estou em Lisboa.

Deixei para trás o sossego de um alentejo ainda quente e dourado, dos fins de tarde rosa e as noites de lua cheia no céu salpicado de estrelas.O canto dos grilos.O nosso canto...alegre!Uma vida em comunidade.

O sorrisos de quem me acompanhou nesta missão.

As vidas daquelas meninas que me fizeram ver tanta coisa.Crescer.Mas sobre essa experiência falarei mais tarde.

Por aqui já tive tempo de estar com o meu pai, e perceber que a minha missão agora, é ele.

Já tive tempo de resolver e decidir algumas coisas aqui no meu coração, de rever rostos e lugares, de me embrenhar na confusão da cidade, de não ter tempo para escrever como tanto gosto, mas de estar em paz, aceitando o que vier de coração aberto, confiando sempre.
Mas ainda não tive tempo de voltar a mim, de me sentir aqui.

Estou preocupada, com o meu pai e isso tem-me absorvido os pensamentos...o tempo.Pudesse eu tirar-lhe o sofrimento...e trazer-lhe de volta o que vai perdendo, lentamente.

Mas enquanto há vida há esperança!Essa nunca eu hei-de perder.

Rezo.

Rezem.


domingo, 7 de setembro de 2008




Agosto 2008




Angola - Chinguar









Recém chegado de Angola, ainda com o coração lá...estive á conversa com o Jp, que partilhou comigo estas imagens...
Não há de facto palavras que descrevam uma experiência destas.
Quem lá esteve também, foi o nosso Cabrita, que ainda anda por terras Algarvias a descansar.
Eram 16, mas por agora, ficam as imagens da felicidade dos dois e de quem eles encontraram pelo caminho. =)











Uma ponte, que segundo ele, era segura.















Estes sorrisos...








Há alguma coisa que explique o brilho destes olhares?
A Alda...
As crianças são mesmo o melhor do mundo!














Os dotes de malabarista do Cabrita...eu sabia que iam encantar...















Descrição do Jp:" A árvore que dá crianças...!"










Alegria...







O Cabrita, nas suas aulas de Português!








Onde está o Jp??


Quase que adivinho o som desta imagem :" eeeeeeeeeeeeeehhhhhhhhhh"!

Obrigado pela partilha...o mundo precisa de corações destes, capazes de ir...e que bom estar rodeada por tantos.

Ainda que haja muito por contar, mas que só vou saber depois da viagem louca que o Jp vai fazer, sozinho, de mochila ás costas para a Républica Checa, confiando na sorte.E tudo porque sempre teve uma panca em lá ir.Não é que vai mesmo?

Ai quem me dera!

Talvez estes dias, sejam precisos depois de uma experiência como esta...cá te esperamos para te ouvir!

=)

sábado, 6 de setembro de 2008

A REALIDADE PARA LÁ DOS MUROS




Assumar (Monforte - Alentejo)




Centro de Recuperação de Menores de Assumar – Congregação de Irmãs Hospitaleiras do Sagrado Coração de Jesus




O relato de alguém:




«A Congregação de Irmãs Hospitaleiras do Sagrado Coração de Jesus foi fundada em 31 de Maio de 1881, em Ciempozuelos- Madrid (Espanha), sob o impulso de S. Bento Menni, Maria Josefa Récio e Maria Angústias Gimenez. A sua origem está vinculada à necessidade de responder a situações de carência assistencial, abandono e exclusão social de pessoas com perturbações psíquicas, especialmente senhoras.
Ao longo de mais de um século a presença da Congregação no mundo tem vindo a expandir-se, encontrando-se hoje presente em 25 países.
Em Portugal a Congregação está presente desde 1894, e realiza a sua missão em 12 estabelecimentos de saúde, dos quais 9 situam-se no Continente e 4 nas Ilhas Autónomas, nomeadamente 2 na Madeira e 2 nos Açores, tendo um total de 2790 camas de internamento. As áreas de intervenção são entre outras: psiquiatria, psicogeriatria, deficiência mental, psicopedagogia, dependências e reabilitação psicossocial.
Desde a sua fundação, a Congregação tem como um dos objectivos prioritários o de proporcionar às pessoas acolhidas nos seus estabelecimentos uma assistência e cuidados de saúde integrais. A sua missão desenvolve-se através da oferta de serviços de saúde para pessoas com perturbações mentais, deficientes físicos e psíquicos e, ocasionalmente, pessoas com outras patologias...»
Quem atravessa o Assumar (uma das Freguesias do Concelho de Monforte), em direcção a Arronches, ali junto à passagem de nível, depara-se com uma construção austera com mais de 60 anos, cercada por um imenso muro. Inicialmente esta construção destinou-se a centro de formação de capatazes/agricultores que tinham como destino as antigas colónias.
Depois de 16 anos encerrada, passou a funcionar ali o Centro de Recuperação de Menores de Assumar da Congregação das Irmãs Hospitaleiras do Sagrado Coração de Jesus. Para lá dos seus muros há uma realidade que, muitas vezes, a sociedade procura ignorar.
Um conjunto de mais de cinquenta pessoas cujos braços,protegem cerca de 120 utentes, cujas idades oscilam entre os dois anos e meio e os mais de cinquenta.
Sob a batuta da irmã Fernanda Ramos, directora do Centro, coadjuvada por professores, assistente social, educadoras e demais pessoal auxiliar, decorrem os dias dedicados a uma profissão que se transcende numa quase devoção a esta causa tão nobre, cujo lema: Cuidar, Reabilitar, Promover, Humanizar… está patente no relacionamento carinhoso, por vezes até enternecedor como o que presenciámos.




















De toda a parte do país chegam crianças, adolescentes e senhoras para aqui ficarem internadas. Algumas como o último reduto de uma já longa “peregrinação” por outras instituições que as recusaram, paradigma de uma sociedade que, teimosamente, tenta ignorar estes seres dóceis que tiveram a fatalidade de serem diferentes dos demais.
Estas utentes estão distribuídas por sectores, tendo em conta o seu grau de deficiência que pode ser: deficiência severa, grande deficiência e deficiência menor.
Na imensidade das instalações, agora ampliadas, deparamo-nos com salas de refeições onde impera a higiene e o pormenor, aqui não se come em pratos de alumínio, mas sim nos de loiça normal e corrente como em qualquer casa de família. Os quartos alojam duas ou três internas, dispondo de roupeiros e casa de banho, a fazerem inveja a muitas residenciais ou, até mesmo hotéis. As salas de actividades são arejadas e nelas o pessoal desenvolve as terapias adequadas a cada grupo.
Numa outra sala fomos encontrar o Miguel, fisioterapeuta nascido em Monastério (Badajoz) que aqui exerce a sua profissão.
Para tudo isto funcionar normalmente, a instituição conta para além dos seus meios com a ajuda da Câmara Municipal de Monforte e várias entidades, dentro e fora do concelho, a Segurança Social e Fundos Sociais Europeus. Aliás, é o próprio Prof. Daniel Balbino que nos conta da sua presença com um grupo destas jovens em Estrasburgo, quando visitaram o Parlamento Europeu.
Muitas são as actividades que se desenvolvem com as internadas, tais como a dança, os passeios pedestres, excursões, a natação em piscina coberta e aquecida e a equitação, esta através de um protocolo com o Grupo Territorial de Portalegre da Guarda Nacional Republicana que para aqui faz deslocar alguns cavalos.
Há casos de sucesso que extravasam estes muros, como o da Manuela, a frequentar o 6º ano na Escola de Monforte e já com um livro de poemas editado no Ano Internacional da Pessoa Deficiente.
Tentámos como é dever do jornalista não nos emocionarmos com os factos presenciados, para que o relato fosse fidedigno. No entanto, não seríamos coerentes se não disséssemos que vivemos emoções fortes, como assistir ao trabalho do Miguel com uma criança na reabilitação, mas também experimentámos momentos de alegria, como o da pequena Liliana (aqui há duas semanas) nos braços da Professora Isilda Mourato, ou ainda com as danças que executaram para nós. Jamais esqueceremos a alegria estampada naqueles rostos quando viam as suas próprias fotografias… ou o vídeo que para elas fizemos.
Para terminar apenas deixo um pequeno excerto de uma carta escrita por uma mãe de uma destas meninas/mulheres, que sintetiza tudo o que nos foi dado observar: «… Porque aqui não há compaixão, há luta, há esperança, há persistência e há alegria e aceitação. Um pequeno progresso aqui é uma vitória suada… mas tão consoladora como as grandes vitórias…»






É lá que vou estar os próximos dias, para mais uma missão, a última deste verão, volto dia 15...com um coração certamente cheio de histórias para partilhar!


Depois disso, começa um outro caminho...em força!



Até breve...



GnOmA.















Ontem estivemos ao telefone, 1h.Passava das 00h...e eu depois de um café rápido, regressei a casa, fugindo da chuva!
E o tempo voa...quando o que se tem para dizer é tanto, é imenso.
É a velocidade do coração atropelando as palavras que querem sair, acompanhadas de gargalhadas, ou tons mais sérios.
Entre Lisboa e Porto, os Km, ainda são alguns e este verão, não tivemos o nosso tempo, aqueles dias em desaparecemos do mapa, e nos refugiamos por aí, com uma tenda, a banda sonora perfeita e pouco mais...em risadas que vão pela noite dentro, de situações e expressões inéditas por nós vividas.
Fez-me falta, esse tempo.Tempo que ainda há-de vir.Outubro.Nunca é tarde para nós.
Fez-me bem ouvir-te, contar-te, receber-te...sentir que estás tão perto afinal.A tua voz, que acalma.
Há quem consiga estar já ali, mas fazer-me sentir que está muito, muito longe.
Mas tu não.Tu existes sempre perto, como se a tua presença fosse quase como uma alma que me acompanha.
Quando desliguei o telefone, estava tão calma e tão feliz, e repetia para mim mesma, que bom que existes, que bom ter a tua amizade e poder dar-te a minha.Assim livre...nunca nos preocupando quando estaremos juntas, ás vezes passam meses, mas depois vêm assim 3 dias , inesperadamente, que compensam todo esse tempo...e nos reforçam a alegria e aquela paz, que vê e deposita cor em tudo.
O nosso adeus, é sempre tranquilo, sabemos que mais tarde ou mais cedo, iremos pelo mundo espalhar e receber magia!E vai ser assim, mesmo com 90 anos...não é?
Não há palavras perfeitas para escrever sentimentos.
Até porque não há sentimentos perfeitos.
A beleza do sentimento está precisamente nas suas imperfeições,nas suas rugas, nas suas feridas e cicatrizes...Naquilo que dói...E se faz poema.
Aguardo-te com saudade...e um sorriso =)

SEC - semana de encontro com...



SEC - Semana de encontro com...






Apenas hoje me sinto preparada para falar de uma experiência que tive estas férias...
Mais uma...sim.
Mas há aquelas em que nos é fácil dizer tudo o que sentimos, tudo o que ficou em nós...e há aquelas em que levamos dias, senão semanas e meses a perceber o que mudaram, o que deixaram.
Foi logo após ter chegado da Covilhã, estive apenas um dia em casa.
E amigos, da SEM (Semana Missionária) em Arganil, já me tinham falado da SEC, (Semana de encontro com...), e convidaram-me a aparecer para ajudar,mesmo que já não fosse a semana toda, iria aqueles dias.
Encontro com...???
Econtro, com as pessoas de um bairro de lata.
Não fui para muito longe, pelo contrário, fui para bem perto...Odivelas, mais especificamente Póvoa de Sto.Adrião!
Essa bela terra, que tive o prazer de descobrir, onde vivem rostos amigos, que não esqueço.
Essa terra que tem o seu encanto nas pessoas que a habitam...são elas que fazem daquele local especial e acolhedor.
Que melhor forma podia ter de terminar as minhas férias, o mês de Agosto, tão cheio de experiências marcantes.
Muitos pensam que enlouqueci, um bairro de lata, para acabar Agosto em Beleza??!!
SIM.
Um bairro de lata, onde existe um amontuado de "casas", construídas clandestinamente, onde os esgotos não fazem parte do saneamento, onde o cheiro é o do lixo amontuado nos caminhos,estreitos e sinuosos, onde as crianças de meses, brincam na rua com cães vadios, onde essas mesmas crianças olham umas pelas outras...
SIM.Foi para ali que escolhi ir, os últimos dias das minhas férias, para me encontrar COM...com quem viesse, com quem lá está, com quem é discriminado pela sociedade porque vive ali, porque é de outra raça, porque é pobre, com quem sabe acolher de forma única e dar do pouco que tem com alegria, como eu nunca vi.
É ao lado desses que eu quero estar.Cada vez mais.
E lá fui.Numa manhã solarenga, lá punha eu a mala ás costas e dizia á minha mãe, "até domingo!"
Apanhei o comboio anciosa, e depois o metro, parecia que ia para um acampamento, de mochila, esteira, saco cama, mas isso porque iria dormir no chão.Mas lá ia eu para mais uma pequena grande missão, dentro da cidade, já ali ao lado.Onde era preciso.Feliz, como se partisse para longe.É esse bichinho que se chama missão, que nos move.Seja longe ou perto.
Cheguei, depois de rever a Ir.Beta e o Luís, companheiros da SEM e deixar as coisas no centro paroquial onde dormimos, seguimos por fim para o bairro do Barruncho.
Caminhei uns minutos, á conversa com a Ir.Beta, matando saudades e contando as aventuras de verão...e dei comigo, numa rua, cheia de vivendas muito bonitas, ao longe só avistava prédios altos e pensei, que o bairro ainda ficaria longe.
Mas á medida que fui caminhando, comecei a descer por um caminho de terra batida, que me mostrava um imenso buraco, onde estava o bairro, e eram centenas as barracas.
Enchi o peito de ar e pensei: "É aqui que eu vou trabalhar!"
Não senti receio, pois estava com alguém que conhecia o bairro e quem vem por bem, normalmente não é mal recebido.
A primeira imagem, foi a da Ana, a minha companheira da SEM, estava com 1 criança ao colo e mais duas muito pequeninas agarradas ás calças, subia com esforço uma ladeira, tinha ido busc´-las a casa, era perto das 10h da manhã...
E esse era o trabalho de todas as manhãs, ir buscar as crianças, que se deitam tarde e acordam tarde em tempo de férias...
Assim, também eu mergulhei pelas ruas do bairro, sem conhecer, era subir e descer, um autêntico labirinto de caminhos estreitos e enlameados.
Fui com o grupo e assim fomos batendo ás portas...chamando pelos nomes, alguns abriam a porta ensonados e gritavam que se iam despachar, afinal não era todos os dias, que alguém lhes batia á porta para brincar e estar com eles, outros estavam a tomar o pequeno almoço, batatas com atum, o resto do jantar, pois o leite e o pão fresco é um luxo.
Fiquei sem saber o que pensar...crianças tão pequeninas a tomar conta de si, a comer o que têm, a lutar pela vida como sabem, como podem.
Como não podia eu, escolher estar ali?
A alegria daquelas crianças, quando as levávamos pela mão, a rebeldia também em fugir e lá tinhamos que voltar para trás...para as convencer a ir connosco, trabalho nem sempre fácil...e bem sucedido.
Juntávamo-nos na casa da D.Conceição, uma senhora que disponibilizou o pátio da sua casa, para que ali reunissemos, com alguma sombra, sentados no chão, em roda, começar o dia com uma oração, simples. Depois os mais pequenos iam para outra casa, enquanto os mais velhos, jogavam á bola, a sua grande paixão.Entre desenhos e actividades preparadas pelo grupo, os dias destas crianças, tomaram uma cor diferente, deixaram de ter o abandono de estar em casa, sem ter o que fazer, ou apenas a vaguear pelo bairro...pondo muitas vezes em perigo a sua vida, pelas mais diversas razões.Elas gostavam de estar connosco, mesmo na sua rebeldia e choros de zanga, tudo o que queriam era um colo, um abraço, uma palavra...
A manhã passou-se entre jogos e buscas pelos que fugiam da casa onde eu estava com os mais pequenos.Mas logo voltavam, mais sujos depois de alguma queda, mais esfolados...mas a sorrir e prontos para mais traquinices.Sem medo de nada.
Sedentos de atenção querem sempre ser os primeiros, os melhores, ter o lugar de destaque, talvez fruto de uma falha nos afectos...grande.Podia sentir.
Limitei-me a estar, a abrir os braços, a sorrir e a brincar muito...não tive grandes ambições de mudança ali, mas sim ir dando aos poucos...de uma vez só é impossivel.
Claro que o meu cabelo, foi alvo de 1001 perguntas, se eu era Africana, se tinha estado em África, ao que eu respondia com um sorriso, que não, mas que gostava muito de lá ir um dia, eles que também não conhecem, diziam que os pais, tinham nascido lá...são pois a 2a geração, aquela que é já Portuguesa, e deve por isso, ter tantos direitos como nós temos.
A manhã passou a correr, o sol pelas 13h, era insuportável e eu já me sentia desfalecer e ainda tinha acabado de chegar.Ao levar as crianças para casa, para o almoço, podia sentir o suor, na minha pele misturando-se com o pó branco dos caminhos...e imaginei como é viver ali, anos e anos.
Imaginei este grupo, maravilhoso que ali trabalhou a semana inteira...não é fácil.
Juntámo-nos para almoçar no centro, passei água fria pela cara e enchi-me de coragem, eu tinha que dar força a um grupo que encontrei cansado de uma semana assim, como tinha sido a minha manhã...e decidida, coloquei um sorriso e novas ideias, para a parte da tarde e para o dia da festa que se aproximava.
Ao almoço, já não havia espaço para o "não gosto disto" ou "não me aptece comer"...e agradecemos pelo que temos, com amor.A mesma alegria da SEM, entrou em mim, os cânticos, os rostos o espiríto que se vive numa mesa cheia de gente, que vive para dar e não apenas para ter.
Depois do almoço, reunimos para acertar as tarefas da tarde, teriamos que ensaiar com os mais velhos uma peça de teatro, a parábola do filho pródigo, para Sábado, onde estariam os pais e as pessoas do bairro a assistir.Empenhei-me com todas as minhas forças em planear.
Era hora de voltar ao bairro, com energia renovada, ia eu.
Arranquei sozinha, no meu passo lento e ia pensando em tudo o que uma manhã me tinha abanado...dei comigo a entrar no bairro, sozinha, sem medo, a falar com as pessoas que passavam por mim, e com que força faria eu isto, noutro tempo, noutro lugar?
Não sei, mas sei que ali o fiz e o fiz de todo o coração.Queria mesmo estar ali...
Uma criança ao ver-me vem a correr ao meu encontro, dá-me a mão e percebendo que o caminho era inclinado, e eu ia meio insegura, diz-me : Não te preocupes, que eu ajudo-te, ok?", e ali estava eu, com uma criança de 4 anos pela mão, que me ajudava a descer uma rua, como se isso fosse a coisa mais importante naquele momento...tal como era para mim estar com ela.
A tarde, não foi fácil, de novo ir buscá-los a casa, depois reunir, e tentar fazer algo, mesmo quando os mais velhos só querem jogar á bola, e não ouvem o que pedimos, mesmo que seja com jeitinho.O meu grupo, começou a querer desistir, e a querer fazer outra coisa que não fosse o teatro...mas não podiam desistir ali, depois de tanto trabalho.
O truque foi, começar a ensaiar com os que estavam e os outros por interesse aproximavam-se aos poucos e iam ficando...á espera de um papel, de uma função.Havia para todos.
Assim, eu fui escrevendo as falas, de cada um, e entregando-lhes em mão, para que as estudassem em casa, e rezava para que não as perdessem, pois foi exactamente o que aconteceu.
Fora isso, o ensaio lá se fez, depois de muitas tentativas, de muitas risadas...e desvaneios.Conseguimos ensaiar 2 vezes, uma vitória...
Nessa tarde a D.Conceição, não nos deixou ir embora sem lanchar.Nós eramos tantos, mas ela atarefada, ia pondo a mesa, cozinhando, aquecendo e lá entrámos todos, crianças, adultos, seriamos uns 20 á volta da mesa...tudo posto com cuidado, para nos receber, o cheiro era bom, cozinhavam cous cous em forma de bolo,quentinhos, para comer com manteiga, e beber com leite e chá.Soube-me pela vida, depois das energias gastas no ensaio.Primeiro as crianças e depois nós.Uma troca de culturas e costumes ali presente.E mais que isso, uma barreira ultrapassada, entre raças, estatutos sociais...o que fosse que nos separasse, ali já nada existia.
Antes de começarmos, a D.Teresa, uma senhora adorável lá do bairro, bem mais velha, começou a cantar, em jeito de oração, e todos parámos, eu arrepiei-me com a fé daquela mulher, que cantava do fundo da sua alma, feliz por nos ter ali.
Terminado o lanche, voltámos á base, o nosso centro, para trabalhar, para a festa e viver em comunidade.
O cansaço era visivél no rosto de todos...o jantar, preparado por uma senhora com todo o carinho, deu-nos forças, para uma noite longa.
Na igreja da póvoa, relaizou-se uma vigilia de oração, onde o silêncio, depois de um dia cheio, foi um encontro pessoal...foi o terminar perfeito.
O dia terminou com a partilha, na oração, e depois de ouvir todos, senti-me muito pequenina, pois o que cada um tinha vivido naquela semana, era tanto, comparado com um só dia, como o meu.E por isso partilhei, que nem que fosse por um só dia, já teria valido a pena estar ali, fazer o que fiz, sentir o que senti, ver o que vi...sujar-me, aleijar-me nos pés, cansar-me, porque nos acorda.Porque nos faz querer mudar o mundo.Agradeci, porque tanta gente, se dava assim...agradeci pelo grupo e por ter mais 2 dias, para viver esta experiência de braços e coração abertos.Nada fica igual, nunca mais.
Deitei-me, depois de acabarmos os embrulhos com doces para a festa...tomei um banho, e caí no saco cama, no chão, que me pareceu a melhor cama do mundo, naquele instante.
O dia amanheceu cedo, depois da oração e do pequeno almoço, sempre com a alegria de uma casa cheia de gente, a manhã foi de retiro, cada um, teria tempo para estar sozinho, ler um texto e refletir.Ao fim da manhã, seria a partilha, que mais uma vez foi intensa.
Depois do almoço, foi o grande momento de ir para o bairro e preparar a festa com as crianças e a comunidade.O material preparado no dia anterior, ia nas nossas mãos, como um tesouro, porque o preparámos com tanto empenho e carinho.
Ao chegar, as crianças correm para nós, com a sua melhor roupa, e de banho tomado, preparadas para a festa.Começamos a montar tudo, enquanto uma equipa organizava o terço pelas ruas do bairro, outra ia preparando o espaço da festa.Enquanto pendurava balões coloridos, no toldo, via e ouvia o grupo pelas ruas, ao qual se iam juntando mais pessoas, á medida que passavam.
As cores iam alegrando o que é cinzento e em menos de nada, o espaço parecia outro!Fizémos também uma exposição com os trabalhos das crianças...tapando as paredes com capulanas!De repente vi-me em África...assim num relance!
Aos poucos começaram a chegar e a querer entrar...a casa da D.Conceição era o centro de tudo nesse dia...e senti que aquela era também a minha casa, a nossa casa, pois ali entrava e pedia tudo o que precisasse, coisas para o teatro de ultima hora...na sua disponibilidade e na sua pobreza, parecia ter tudo.Mas se há coisa que tenho aprendido é que, quem tem menos, é quem dá mais...sempre!
O teatro começou, o silêncio ouvia-se...e mais ou menos bem, as frases lá sairam, do jeito que eles souberam...vestidos com os fatos que cuidadosamente cortámos com sacos e com o que havia...eu estava orgulhosa de todos, pois o que parecia impossivél de se fazer, aconteceu e correu bem.E a mensagem passou.
Depois foi a vez de lanchar...pusemos uma grande mesa, sumos e bolos, para todos...e uma medalha em forma de coração, que dizia, "Deus ama-te!", um embrulhinho com doces, que desapareceu em menos de nada...mas alegria e festa!E sobretudo, simplicidade.
O fim de uma semana árdua...mas gratificante, sentir que ali todos éramos de facto amigos...e que o importante apesar de todas as nossas diferenças, é que Deus nos ama, da mesma forma, com o mesmo amor.
Dali seguimos todos para a eucaristia, onde as crianças também participaram, cantando na acção de graças: " Belo, belo, Jesus é belo e Jesus faz belas as coisas da vida!!"onde também se agradeceu á comunidade, por todas as ofertas, e apoio.
A noite terminou com a partilha e como era a última noite, alguns de nós ficaram á conversa...em partilhas que marcam sempre.As poucas horas de sono, não afastaram a alegria de receber no Domingo, mais jovens que nos tinham também visitado na SEM, e alguns que participaram na SEC, do ano passado, vinham do Porto, mas não é de admirar, pois nesta SEC, estavam 2 raparigas dos Açores, da ilha treceira, vieram de tão longe...
Juntos celebrámos a eucaristia, onde as pessoas do bairro participaram e ali os últimos abraços e despedidas, um obrigado pelo acolhimento 5*****, que não esqueço.
Almoçámos todos juntos, uma festa sem fim...um rever de rostos solidários e uma certeza...de que é Bom ser missionário, é bom estar no mundo...fazer parte dele, mudando-o pela nossa passagem...criando laços.Sem preconceitos...
Pelo meio da tarde, o centro estava arrumado e limpo, as coisas arrumadas...eu fui adoptada pelo pessoal da póvoa, que só me deixou ir para casa pelas 00h, alegando que precisavam de ajuda em algumas tarefas...e foi em casa dos manos Ana, Luís e Rui,que nos reunimos,eu a Marta, o Cunha...ainda com aquele sentimento de comunidade, que ali sempre se sente.
Ainda nos despedimos, com uma surpresa, de 2 seminaristas, que partiam no dia seguinte para Itália, tiveram direito a uma serenata e tudo!
Chegámos a minha casa, e uma hora dentro do carro a rir a chorar e a partilhar o que de mais forte pode haver.
Obrigado, por terem sido o desfecho mais bonito que podia ter...destes dias.Para mim um descobrir sem fim,de pessoas bonitas, que valem a pena...e que marcam.
Mas sobretudo um descobrir de um caminho que cada vez mais tenho a certeza ser aquele que me conduz á plenitude.
Sei, que agora, qualquer dia posso entrar no bairro do Barruncho e não sentirei medo, logo encontrarei um rosto amigo...e muitos são os que ali não entram por desprezo...dois mundos tão distintos, separados por escassos 300 m...

Não vejo nada da mesma forma, tudo muda, depois de dias assim.Tudo o que tenho é demais, é um luxo...só posso agradecer, mas também partilhar.
Partilhar com vocês o que senti, ainda que as palavras se tornem monótonas e longas...mas não há imagens que falem pelo que senti...ás vezes é assim.


Encontro?
SIM.
Só posso dizer, SIM.