quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Tenho um sismógrafo,no lugar do coração.

 






"Acho que não devia fazer electrocardiogramas eu, devia fazer escalas de Richter porque me parece que em lugar de coração tenho um sismógrafo cuja agulha assinala o menor estremeço interior ou exterior com uma amplitude imensa: basta-me viver para a agulha não parar e que cordilheiras de tinta os meus dias. Se me perguntam:
- Como vais?
só tenho a mostrar riscos enormes, capazes de fazerem cair todos os prédios da cidade e espanta-me que Lisboa permaneça intacta e o chão nem oscile."


Lobo Antunes

quarta-feira, 28 de novembro de 2012

O dia em que deixamos algo para trás.






É um dia igual aos outros. 
De manhã o sol nasce e à noite põe-se e fica escuro outra vez. 
Os donos passeiam os cães de manhã, os pais deixam os filhos na escola, as pessoas esperam pelo autocarro e a manteiga está dura de estar no frigorífico, como sempre.Pessoas partem e chegam a diversos pontos, enquanto eu desejo e vou vivendo e pensando em tudo isto.Amando o mundo, desta forma que me aquece.
Mas não é um dia igual aos outros, cá dentro não é.O dia em que se parte ou de deixa algo para trás.
O mundo que continua a girar com a mesma velocidade e as mesmas rotações por minuto parece que está envolvido numa espécie de celofane, ou que saímos de casa, com aquelas borrachas para o barulho ainda nos ouvidos. A vida continua, mas parece que só lá ao fundo, quase irreal, como as imagens que passam nas salas de espera das urgências e a quem ninguém liga. O dia em que as coisas acabam, tem 24 horas como os outros mas é uma espécie de maratona interminável. É o dia do nosso adeus com um sabor meio desastroso, um adeus,que sabe bem pior do que ter negativa na escola ou perder uma corrida, ou queimar o jantar com convidados à mesa, porque é um adeus, que vem de dentro, que vemos só como nosso, mesmo quando  é pouco justo, impor esse peso.
Porque apenas eu sei o que vivi e não o posso explicar.E isto funciona como uma bolha.
É o dia em que queremos que falem connosco e nos façam esquecer este aperto no peito, ou então que fiquem calados, porque dói se disserem coisas tristes, e dói se disserem coisas felizes. É o dia em que sentimos que estamos a deixar tanto para trás mesmo quando as pernas andam para a frente, e como somos humanos, não conseguimos evitar ficar ainda mais, um bocadinho mais tristes. Dizem-nos que é o primeiro dia das nossas vidas,quando deixamos algo, mas enquanto acontece parece só um grande, enorme,Adeus.
E depois permanecemos num limbo, que mais tarde ou mais cedo termina, porque tudo o que queremos, acaba por acontecer.
E depois, hei-de escrever sobre o dia em que inicio algo, de novo e da felicidade que isso me faz sentir.Eu sei,eu sei que vai ser assim.Mas ainda não chegou o dia.
 E viver, como eu escolhi, passa por tudo isto, a euforia da partida, em que não se vê mais nada, apenas, o ir.
E nesse dia somos os maiores.E podemos ate deixar algumas coisas para trás porque elas não interessam naquele momento.Mas elas não deixam de existir.
Depois a alegria da chegada e dos reencontros, que nos dizem o quanto somos amados.O nosso espaço, as nossas coisas...os sabores, cheiros de sempre.
Logo a seguir, vem a apatia da estadia,(a fase em que e encontro neste preciso momento...) para quem como eu nunca parava quieta e encontra um Portugal pior do que nunca.Embora lute diariamente pelo futuro e tenha planos bem definidos do que quero a seguir.
Mais tarde volta-se a uma montanha de emoções, porque algo surpreendente nos espera e acorda em nós o espírito de aventura e entrega, perto ou longe.
Mas a reconfortar-nos temos as recordações, e aquilo em que nos tornamos e que já ninguém nos tira.
A riqueza infindável que nos habita.
A vida, toda ela, uma montanha russa.





terça-feira, 27 de novembro de 2012

31.


 

 







 
 
 
 
 
Passam trinta e um anos desde que nasci. 
Sei que fui uma bebé muito amada, com um crescimento normal,mas tenho a sensação que fui sempre meio rebelde e, como não sinto pena nenhuma disso, sei que ainda hoje o sou.Caracteristica que me tem levado a conquistar os sonhos.Os que mais queria, os que me fizeram discutir...porque seriam bons para mim, ou não.
Cumpri-os.E ainda faltam tantos.

 Foi um aniversário diferente: passado em casa,perto da família que existe aqui, dos amigos mais queridos e com toda a alma com outros tantos espalhados pelo mundo que se lembraram de mim.Existem laços que parecem ser de sangue e os chegam a substituir e a anular.E eu sei porque o digo.
Lembro-me dos 23 ano, no hospital, depois de ser operada, ainda com dores e meio sem saber o que ia acontecer.Lembro-me de querer sair dali, mas pensar que tinha o maior presente de todos, a vida.
Lembro-me dos vinte e cinco anos e uma festa de arromba com 50 pessoas.Metade dessas pessoas desapareceu.Ficaram 4 ou 5, e que amo muito. 
Lembro os 27 em plena aventura, rumo a Escócia, primeiro um avião e depois um comboio, para reencontrar o Duarte, sem um sítio para dormir com espaço e a partilhar tudo, as palavras desenfreadas pela saudade,com neve na janela, e frio, muito frio, mas um calor que ate hoje perdura.Ou lembro os vinte e nove na Turquia com uma família Turca, que me acolheu como filha.E tive um lindo bolo e um anel de princesa.
Mas desta vez houve surpresas que não esperava.Foi tudo tão natural, aconteceu...e eu deixei que estes dias fossem indo e me contagiassem com uma alegria extrema e profunda gratidão pelas pessoas maravilhosas que me rodeiam.
Mas tive saudades.Saudades do meu sol e dos meus rostos de Moçambique.Um bocadinho só.
Pelo menos tive uma data de crianças lindas  a cantar-me os Parabéns e roubar-me o protagonismo no momento de soprar as velas e por isso dou-me por satisfeita...pois para eles aquele momento tem magia.Com ou sem os Konguitos, senti essa cor.

Tinha uma foto perdida, do meu Pai, nas malas ainda por desfazer, que guardo como garantia do cheiro de Moçambique, e quando me chegou às mãos, foi como se fosse um sinal. 
Eu sei que muitas coisas são difíceis, como esta crise, como o facto de já não o ter aqui, mas, se parar para pensar, há algumas que só precisam de mim mesma para acontecer. E por isso gostava de continuar a adoptar isto como o meu lema nos próximos anos: nada é impossível! (Tendo em conta tudo o que já aconteceu na minha vida)
E assim sendo há umas coisas a que me proponho no futuro: perder mais peso (para ajudar ao peso perdido), continuar a viver pelo Mundo (embora me tenha afeiçoado a alguns locais que me marcam, quero ver e tocar mais este planeta!) e agora o desejo de sempre,escrever um livro. Infelizmente, para este último desejo, falta-me muito, inclusivamente perceber como se faz. Mas ninguém paga por tentar!E a mim não me falta o que contar.
Gostava de encontrar de vez o meu príncipe desencantado (que sei ser irreal,ahahah!) e ter uma família, ter um filho.Amar.Lutar por esse amor diariamente.

E prometo tentar viver com menos ansiedade, aceitar os ensinamentos que os momentos mais vulgares nos trazem todas as vezes que lhes damos atenção, ser menos colérica e impulsiva, duvidar menos do meu desempenho como ser humano,pois está mais do que provado que surte bons efeitos. 
Nada mau, para apenas mais um ano de vida e para os 31 que passaram.

E hei-de continuar acreditar tanto em mim como a minha mãe e o meu pai, quando eu nasci e era ainda promessa de vida. Eles sabem bem o que fizeram. E criaram uma miúda que vive como louca a vida que ganhou, e mesmo que não muito normal,ela vive feliz.
No final de contas, os Parabéns não são todos para mim, mas para os meus pais, que me puseram no mundo e para os que me encontrando, me fizeram assim.
Todos, todos,todos os que se cruzaram comigo, (mesmo que por pouco tempo). 
:)

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Os rostos e os lugares dos reencontros



Lisboa


O reencontro com a minha cidade...foi calmo e demorado.A sua beleza fala-me.Senti que me recebia...de certa maneira com a sua luz e charme.Eu habituada a terra vermelha e largos campos...onde corria a liberdade nua e crua.Troco tudo isso, por luzes intensas, correrias, movimento.




Ainda em Lisboa, foi das primeiras pessoas a reencontrar...a Analu, sempre igual a ela mesma.Preparamos um jantar a duas para conversar sem limites, dar conta das mudanças e novidades.E gosto tanto quando o fazemos juntas, pois sinto que ela me puxa há terra...eu que sou sonhadora e utópica.Ainda assim muita da minha utopia, se tem tornado em realidade.

Porto



Chegada ao Porto,visitei a Ir.Beta, que bem procurou a mataquenha no meu pezinho, mas ela resolveu fugir.
 Uma forca de missão, que me inspirou em muito com o seu testemunho de vida.
As horas com ela parecem não passar.E depois resta apenas abrir o coração...
Ri e chorei.Recordei e temi, libertei...sai leve e a sorrir.






A viagem para o Porto, era um momento esperado, reencontrei uma família que ali se mantém de braços abertos para mim, sempre.O meu Juca, que já anda e tem uma vontade muito sua...o meu Gil e a minha Clara, que me povoam o pensamento quando estou longe.
Ajudar nos preparativos do casamento, foi um momento forte, em que me deliciei com a sua forma simples e original de fazer as coisas, de organizar, de pensar e sentir.
Foi dos casamentos mais bonitos em que pude estar e sentir que o AMOR existe.Realiza-se dia a dia no que vai sendo mais duro e por isso se torna belo.
Apesar dos dias chuvosos e frios, o maior calor, reside ali quando nos abraçamos de novo.Na chegada ou na partida... eles os 3 são,o meu "Porto".

 

Braga









Do Porto, segui para Braga, para abraçar outra família.Mais um sobrinho emprestado.
A minha Marcia mudou-se para esta linda cidade faz quase um ano e fui com ela descobrir todos os recantos que fazia tempo não mergulhava neles.Uma cidade onde se vive e ainda se respira.Cheia de historia, de luz e arte.Perdi-me pelo labirinto das ruelas e olhei Portugal de perto.Voltei ao sabor de um café e dois dedos de conversa.Ora chuva, ora sol...assim iam os dias.
O rebento Gustavo levou uma banhoca dada por mim, dançou, reclamou, riu-se...e as conversas foram noite dentro...ao redor da lareira.A vida muda, os lugares por onde andamos mudam, mas nos não.Na barriguinha uma menina vem a caminho...e vai ser linda como o pai e a mãe.
Pude acompanhar de perto a sua rotina.E sentir muitas saudades do tempo em que o tempo era todo nosso.



 Lisboa




 Voltei a Lisboa, e fui visitar o casal mais recente, a Erika e o Paulo.Infelizmente não pude ir ao casamento, mas o convite chegou a Moçambique.Meu companheiro da primeira ida a Taizé.Cheguei a visitar o barco da marinha onde estava...em terra ou no mar, sempre nos comunicamos.Partilhamos um jantar por ele preparado, deliciosamente saudável e um vinho alentejano.Depois foi ver as fotos maravilhosas do casamento.E senti como se sente o começo de uma vida a dois, num compromisso para toda a vida.




Alentejo
 












O meu doce Alentejo, onde me reencontro com boa parte da família e com as origens.Aquelas que me dizem mais.
A família de sangue, ali se mantém.
Voltar ali será sempre, abraçar o meu Pai.E isso nunca posso deixar de fazer.O meu coração há-de sempre levar-me a esta terra que amo.
O branco das casas, o azul do céu em dia de sol...e o verde dos campos,um quadro que guardo.
O tocar do sino...e todas as memorias da infância.O calor de um lume lutando com o ar gélido da noite.
Os sabores aos quais tento resistir...mas não consigo.
E as surpresas que sempre me reserva esta terra, em dias de festa.
Uma calmaria que não tem igual...só eu sei porque, sinto tanto prazer caminhar devagarinho e olhar os olhos de casa um, rua acima, rumo ao castelo.
Na despedida a promessa de voltar em breve...agora pelo Natal.


 Lisboa

 

E de volta a Lisboa novamente, um encontro que não podia esperar mais, o meu Paulinho.Aquela figura mítica da minha vida.Assim que o vi, pensei, há coisa que não mudam e ainda bem.Parece que nos vimos ontem, começamos logo a gozar um com o outro e a rir.Factor alias que aconteceu com todas estas pessoas.E quando isto acontece...a amizade vale uma vida inteira.
O gosto pela musica, a fotografia, o surf, a aventura dos sentidos continua a fazer dele um ser único e que admiro, que me despertou em muito para tantas coisas.
Agora a morar longe, desta cidade onde crescemos, vemo-nos pouco...mas há coisas que jamais morrem.



Sabe-me bem este regresso.Ainda com o panorama negro do nosso Portugal, eu pertenço aqui.E como me faz bem ver os que amo, a evoluir e a mudar as suas vidas para melhor...enquanto eu, vou indo pelo mundo e dando aso aso meus sonhos.
Resta agora saber, nesta onda de reencontros...quem será o próximo?
Seja quem for, será muito bem vindo a este coração...saudoso de quem o sabe ver com olhos de ver.


terça-feira, 13 de novembro de 2012

Last moments in MOZAMBIQUE


























O últimos momentos em Moçambique foram de uma intensidade que jamais saberei explicar.
Se por um lado captava tudo, sabendo que eram mesmo os últimos dias e os vivia intensamente, com o dobro dos sorrisos, abraços e momentos de festa, por outro...o meu coração ia ficando pequeno, silenciado,chegado a um limite.
O que nos consola nestas partidas e o sentimento de missão cumprida e de ter atravessado todos os obstáculos com uma garra incrível que nem eu sei onde fui buscar?
E todo o reconhecimento por parte das pessoas com quem trabalhei, que me deram a certeza de que não podia ter sido melhor...para ambas as partes.
Aquele era o meu dia a dia, a minha rotina, os meus afazeres que cumpria com um agrado que poucos devem sentir nos seus trabalhos diários.Não era o meu trabalho, era a minha vida e só eu sei porque o digo assim, desta forma forte e radical.
Esqueci todos os perigos, esqueci todos os riscos, ignorei todas as coisas pequenas e insignificantes...e somente me dediquei a fazer o que realmente entendi ser fundamental, para essa mudança que quis.
Agora sei que a mudança em mim, essa foi enorme.E devo-a a cada pessoa, com quem me cruzei, mesmo aquelas que me chocaram, pela atitude negativa e pouco comunicativa.
Ao passo que ia pensando no regresso e em todos os reencontros...quem me iam encher de vida, pensava também em tudo aquilo que se vive uma vez na vida, em determinado lugar.Porque o vivi ali e nunca o viverei dessa forma, neste tempo, com aqueles rostos e vidas...perto de mim.
A vida vai avançando...e as pessoas mudam de lugar, mudam de rumo...mas acredito que nelas fica sempre, o que deixamos de bom.Pelas minhas mãos, passaram 90 crianças em sala, mais as que vinham fora do contexto escolar.Vi-as evoluir e aprender a ler e a escrever correctamente,vi-as desabrochar em afectos e regras que desconheciam.Partilhamos tudo, juntos, como se de um mesmo barco se tratasse.
E eles, como me fizeram descobrir capacidades que desconhecia em mim, ou aprofundar aquelas que já me caracterizavam.Foi dos momentos mais fortes da minha vida.
Refugiei-me no lago pela  última vez  durante 4 dias, para me despedir com calma, daquelas águas onde eu mesma desaguei muitas vezes...num ano e meio.Vi e senti tudo o que queria sentir antes de partir.E pela natureza dos dias antes de uma partida, não pude despedir-me de toda a gente como gostaria, e a alguns nem disse um último adeus.Mantenho aceso o desejo de voltar,um dia.
Entrei num avião, onde assim que levantei voo, foi assolado por uma chuva tropical enorme, a primeira da época, não tinha chovido durante meses.Achei curioso.
E fui sentido, hora a hora, milha a milha, Moçambique a ficar mais longe...os rostos de olhos brilhantes,ainda olhando para mim, por uma última vez...o cheiro daquela terra cheia de magia, os sons, que me agitavam a alma... ao nascer do dia.
Desembarquei numa Lisboa bem mais fria, mergulhada em crise, mas sempre bela.Ainda assim tudo me pareceu artificial e demasiado automatizado.
A verdade simples, ficou naquilo que se deu, longe.
Tudo,tudo impresso neste coração, para a vida.