sábado, 31 de março de 2012

Ritinha...




















A minha Ritinha, cresce a olhos vistos.Um destes dias, beijados pelo sol, fui até sua casa...ao longe o sorriso da titia Aciato, a receber-nos.Tão bom.Reencontrar estas vidas, que já me marcam faz tempo e continuam a marcar.
Ali no chão, estava um embrulho, muito bem feito, era a Ritinha que dormia.Não a quis acordar, mas ao som das nossas vozes, ela abriu os olhos.Tomei-a então nos meus braços.Abracei-a e olhei-a, atentamente.Agora com um rosto mais refeito, do parto, mostra mais as suas feições...parecida com os irmãos, uma delas minha aluna.É ali naquela terra vermelha, diante daquele vale imenso e verdejante, que a Ritinha vai crescer, cair pela primeira vez, chorar muitas vezes, mas sorrir sem fim, trançar, carregar água, descobrir o mundo.Eu irei deste Moçambique que Amo, assim como todos nós os que estamos de passagem.E a Ritinha vai crescer por aqui,livre como todos os meninos de chocolate que já fazem parte de mim.
Ter a Rita, nos braços serena, fez-me perguntar vezes sem conta:"E se não amarmos agora, enquanto cá estamos?... pouco valerá amar á distância de alguns anos...o amor não espera, tem pressa em realizar-se. Difícil é amar quem nos faz sofrer.Mas esse é talvez o maior desafio.E quem o conseguir, será feliz.Muito feliz.Porque não há maior virtude que a humildade.O orgulho não nos leva rigorosamente a lugar nenhum.
Tornar os nossos  gestos, coerentes com as nossas palavras.Não basta dizer.Temos que estar ao lado.Dar.
Não para mostrar, mas porque sentimos.O que os outros vêm...é paisagem, mas o que eu sinto é a vida e a cor que eu vislumbro constantemente e me faz feliz.
Foco-me nos pontos de Amor, que encontro por aqui, eles sim, me tornam melhor cada dia.
A Ritinha é um foco de Amor, porque ela é uma promessa, de vida para o amanhã.

terça-feira, 27 de março de 2012

Por cada rosto que chora, há um que sorri.

 
















































Numa terra onde falta tanta coisa, há um equilíbrio entre o que é bom e mau.
Há rostos que me têm falado de forma particular.Leio-os.Há rostos que me prendem, por razões diversas.
É a tristeza, que passam, a dúvida...a surpresa, a beleza, a alegria, a esperança.Há rostos para todos os tipos se sentimentos.
A verdade é que por cada rosto mais triste, encontro um que me sorri...
Por cada morte, há uma criança que nasce...nesta terra.Por cada dia de chuva há um sol que agarra o dia...e o salva.
Por cada história triste, há uma que nos anima.Há um espaço estreito entre o que é negativo e positivo.
Tenho vindo a viver isto, diariamente, mesmo a nível pessoal.Há tanto de bom, mas também tanto de indesejável á minha volta.Não desejo rostos que não possa ler.Não desejo vidas com as quais não possa partilhar o que sou, como sou.Mas essas vidas existem e terei certamente algo a aprender com elas.
Mas depois encontro sempre vidas e tantos rostos que me falam...e me dizem tudo isso que, sei, mas preciso sentir, todos os dias.
Aqui aprende-se apenas com o olhar...esse diz mais, do que qualquer amontoado de palavras bem estruturadas e com a impressão que são proferidas da forma mais inteligente.
A inteligência é um rosto simples, quando sorri, chora ou mostra claramente o que sente.E por aí não há dúvidas.
Tudo o mais, será acessório para mim.
Deixo os rostos, deixo as expressões incontroladas, que me marcam até ao fundo da alma, dos dias, da vida...



domingo, 25 de março de 2012

O amor é...

 



O amor é o início. O amor é o meio. O amor é o fim. O amor faz-te pensar, faz-te sofrer, faz-te agarrar o tempo, faz-te esquecer o tempo. O amor obriga-te a escolher, a separar, a rejeitar. O amor castiga-te. O amor compensa-te. O amor é um prémio e um castigo. O amor fere-te, o amor salva-te, o amor é um farol e um naufrágio. O amor é alegria. O amor é tristeza. É ciúme, êxtase. O nós, o outro, a ciência da vida. 
O amor é um pássaro. Uma armadilha. Uma fraqueza e uma força. 
O amor é uma inquietação, uma esperança, uma certeza, uma dúvida. O amor dá-te asas, o amor derruba-te, o amor assusta-te, o amor promete-te, o amor vinga-te, o amor faz-te feliz. 
O amor é um caos, o amor é uma ordem. O amor é um mágico. E um palhaço. E uma criança. O amor é um prisioneiro. E um guarda. 
Uma sentença. O amor é um guerrilheiro. O amor comanda-te. O amor ordena-te. O amor rouba-te. O amor mata-te. 
O amor lembra-te. O amor esquece-te. O amor respira-te. O amor sufoca-te. O amor é um sucesso. E um fracasso. Uma obsessão. Uma doença. O rasto de um cometa. Um buraco negro. Uma estrela. Um dia azul. Um dia de paz. 
O amor é um pobre. Um pedinte. O amor é um rico. Um hipócrita, um santo. Um herói e um débil. O amor é um nome. É um corpo. Uma luz. Uma cruz. Uma dor. Uma cor. É a pele de um sorriso.  







Guia-me...



















Guia-me quase sempre uma realidade abstracta.

Guio-me pelas decisões que nascem dentro de mim e confio nelas, mesmo que surjam de um dia para o outro...se nasceram, é porque têm razão de ser.E eu, vou atrás dessa razão.

Pouco me dizem as aparências da realidade tangível, explicáveis pelo conhecimento especulativo, preponderantemente racional.

Triturada e fantasista, como um número complexo, tenho maior afecto à minha parte imaginária.
E alimento-me quase sempre dela.Em tudo vejo mais do que ali há...e em tudo coloco gotas de orvalho...e cheiro a bosque.

Prefiro escrever a lápis e ir ligando as ideias com laços.

Faço por deixar alguns traços nas coisas e pessoas de quem gosto; e gosto de descobrir um sentimento de curiosidade onde poderia estar uma leve sensação de falta ou quebra.

E sorrio para dentro, à tranquilidade com que espero aquilo que me mói porque sobretudo me tarda... e acho graça e quero ser mesmo assim.


Como quem não tem o que perder.Porque já conquistou tanto.


Mas há ainda muito a descobrir.






De Portugal...

 


 


 


 


Chegou uma das encomendas que tanto esperava.
O pouco faz a diferença aqui.Numa farmácia onde não há quase nada...onde estudam 400 alunos.Onde todos os dias alguém cai e se aleija...é importante ter com o que trabalhar nestas situações.
Depois além das coisas essenciais, vinham os mimos, de uma família que se faz presente, sempre, de forma surpreendente.
A certeza daquilo que temos e construímos, apura-se nestes momentos.
Bastam 3 ou 4 palavras e faz-se magia.Rasga-se um sorriso.
Sei, que esse apoio não me falta...nunca.E por isso também caminho mais segura.
Oxalá pudessem vir dentro desta caixa...
Obrigado a esta irmã que é gigante!
Aqui, em Istambul, em Lisboa, em qualquer parte do mundo.
É assim quando se ama de verdade.

segunda-feira, 19 de março de 2012

Dia do Pai

 


Dia do Pai.
Habituei-me a que todos os dias dos últimos anos, fossem dias do Pai.Todos os dias foram dele, para ele, por ele, com ele.
Assim que percebi, que a sua vida se ia esvair em menos de nada, que todos os momentos passaram a ser PAI.
Tenho saudades...principalmente de nos rirmos juntos,de dizermos parvoíces e comentar a actualidade,de divagar.Ele ouvia atento os meus sonhos, entendia os meus anseios, caminhos, escolhas.Como ninguém.Sem dizer muito.Sem grandes monólogos.Na sua paz incomparável e que ainda perdura.
Está sempre comigo.Olho a sua fotografia, na parede deste quarto, quando me deito e me levanto, para mais um dia de serviço.Como ele sempre fez.Servir.Á sua semelhança.Querendo ser como ele, alguém de coração aberto aos outros...alguém que sabe sorrir, agir, acolher,mas ser justo também.Verdadeiro.
Era uma pessoa limpa, sem mancha de falsidade ou interesse.Era uma pessoa ás claras.Antevia as coisas, precavia-se para o que por aí vinha.Tinha sempre um mimo, para quem chegava, ou quando ele chegava.Tinha a meiguice e a brandura de uma mãe.Tinha o sexto sentido.Tinha a sensibilidade.
A perspicácia.O amor necessário a um Pai.Bem do seu jeito.Era preciso ler tudo isso,nos gestos, nas palavras,nas pequenas coisas.Essas que valem sempre mais.Que marcam sempre mais.
Saudades,sim, daquelas que não se calam no peito.Daquelas que fazem sorrir, quando vejo um Pai, com um pequenino ao colo e me sinto eternamente feliz e grata, por ter recebido todo o amor do mundo.Ter tido um Pai "gordano", como lhe chamava...que me deu a vida.Uma vida que estou a viver da melhor forma que posso e sei, com os ensinamentos que me deu e que os meus olhos captaram.
E ele estará muito feliz, de onde estiver...seguindo e protegendo cada passo meu.
Obrigado Pai.



quinta-feira, 15 de março de 2012

A Rita...nasceu.

 

 

 



Apresento-vos a Rita.
Nasceu ontem, depois de 7 meses sossegadinha.Depois de um parto muito complicado...em que esteve básicamente, 2h30 entalada, onde a mãe sofria, e ninguém á sua volta, via uma solução.Não a queriam transportar ao hospital, mas também não queriam cortar o cordão.Lá andou a tia Kate, a tentar colocar bom senso nas cabeças...e a correr desesperada por um enfermeiro que a ajudasse.Claro que numa cidade com 160 mil habitantes, ninguém vai a casa...para um parto.
Aqui as mulheres têm os filhos, sozinhas, cortam o cordão sozinhas se for preciso, são parteiras delas mesmas.Isto pode chocar, mas é mesmo assim.
Aqui ficam de lado os requintes e cuidados de higiene, elas aguentam tudo, são mulheres de fibra...de uma resistência á dor incrível.Daí a calma aparente, ou mesmo real,de todos quanto as rodeiam nestes momentos.
A Rita, esteve em sofrimento...mas nasceu, resistiu e está bem.Isso importa.
Quanto ao nome, é de facto mais do que coincidência.
Um destes dias entrei na cozinha,onde trabalha a titia Aciato e por brincadeira agarrei-me á sua barriga , dando-lhe um beijo na barriga e falando com o bebé por graça... e perguntei quando nascia?Se era menino ou menina?Qual o nome?
Percebi que ainda não era o tempo, aqui perdem a conta aos meses...e na maioria das vezes, não sabem o sexo antes.E de certa forma este factor surpresa, agrada-me e acho bem mais interessante.
Mas disse-me que se fosse menina, seria uma Rita e que seria alegre como eu.Fiquei feliz.
Que privilégio...que honra, poder ficar de certa forma por aqui, mesmo depois de partir.
Sei que em Moçambique os nomes, têm sempre um significado, ou não fosse esta uma sociedade maioritariamente muçulmana.O nome de Rita não terá um significado, concreto, mas se isso implicar, ser como eu, apenas desejo que não tenha mau feito...o resto pode ter tudo.
Quero seguir esta vida...quero saber dela, sempre.Mesmo na distância.Gostava muito que esta Rita fosse um agente de mudança no mundo, neste mundo onde vai crescer e provavelmente viver.
Sabe Deus as voltas que uma vida pode dar...e onde chegar.Olho para  a minha própria vida e penso que não há nada que não quisesse que não tivesse alcançado.E a vida ainda me deu mais.E a isso eu chamo determinação.Ainda que atribulada...muitas vezes, sabendo tão bem onde quero chegar.
Será muito feliz esta Ritinha.E no que puder ajudar...estarei mesmo na distância.
Bem vinda Rita, a esta aventura que é o mundo...


E com ela também eu renasci um pouco...de tantas cinzas que têm caído...por aqui.


quarta-feira, 14 de março de 2012

E depois da chuva...




É tempo de quebrar este "afastamento" do blog.
A verdade é que mais do que em qualquer outra parte do mundo, aqui, escrevo menos.Tento explicar o porquê, mas não há grandes motivos...
É como se, até o tempo para escrever fosse  retirado a esta maravilha que é África, que é observar, sentir, falar, lutar por...seja o que for.Partilhar.Quando me sento na secretária e abro a janela, vejo as copas das árvores, os corvos da Índia a pular nos telhados, o céu azul, ou mesmo a chuva a cair...
Mas quando escrevo, é convictamente porque preciso de o fazer.Não chegasse eu tantas noites á cama, desejosa de dormir, não fossem as 2h de diferença que me separam de Portugal e me fazem esperar que apareçam aqueles que são a minha força na distância e por momentos nos cruzemos, no tempo e no espaço.É de muitos desses momentos, que vou retirando uma parte do meu sorriso...energia, confiança.
Saber que há todo um mundo, que me conhece, como sou, sem tirar nem pôr, que me ama assim mesmo, que não me julga...e vai sempre esperar por mim.Para sorrir, viver, sonhar...acreditar.
Está feito um mês, desde que cheguei novamente.
E um mês, pode ser tão...decisivo, na nossa visão das coisas.
Um mês é talvez pouco tempo para sentir, para perceber o local, as pessoas, a realidade...mas entendo que seja tempo mais que suficiente para olhar para quem vive connosco, diariamente, para olhar para o nosso trabalho e desempenho em determinado projecto.
Pois lamento, que algumas pessoas, não tenham essa visão, essa perspicácia, de sentir que aqui não é o seu lugar, que não vieram em nada contribuir para melhorar a vida dos locais e desta terra.
Quando não há colaboração, partilha, quando cada um quer ser por si e apenas por si.Não resulta.
Como pode alguém vir para um projecto destes e não sorrir?Como pode não abraçar uma criança, ficar com os olhos brilhantes, vibrar, apaixonar-se pelas pequenas coisas?Como não nos entregarmos por inteiro a estas pessoas?...e principalmente aquelas que vivem na mesma casa do que nós?
Ninguém aguenta uma refeição em silêncio, nem uma cara fechada...ninguém aguenta falta de amor.
Uma porta fechada.
Enquanto tiver voz, não me calo a este tipo de situações.Porque servir, é muito mais do que colocar um pé neste solo e andar para trás e para a frente, vendo quem passa.Ou há trabalho bem feito e rigoroso, ou não estamos aqui a fazer nada.Porque aqui merecem tudo, merecem mais, sempre.
Onde não há partilha, nunca haverá entendimento.
A vida continua depois das tempestades, há que recuperar cada pedaço, reconstruir, mas as marcas, essas, nunca se esquecem.E das duas uma, ou aprendemos com elas, ou sofremos a vida inteira, porque não fomos capazes de lutar, enfrentar, ousar.
Há 3 vidas nesta casa que se cruzaram e se aceitaram, que fazem as coisas acontecer.Há uma vida, que se foi desta casa, que não percebeu o objectivo a atingir.
E eu arrisco a dizer, só faz falta quem cá está...quem suja as mãos, quem sente o coração bater por cada história de vida, pelo que vê e toca.
Não há outra forma de viver, Moçambique.

terça-feira, 6 de março de 2012

São os rostos...que me marcam.São os dias que me constroem.

























São tantos os rostos que me marcam.São tantos os olhares que vou captando e retendo.
É isso que me marca.É isso que não esqueço.É isso que me intriga, que me seduz neste povo...Há traços vincados, há expressões tão únicas e claras, que podemos vislumbrar o que querem dizer.
Aqui leio perfeitamente os rostos, os olhos, os sorrisos.Habituei-me então, por onde andei neste mundo, a fazê-lo.A ler os sinais.A compreender os detalhes, que já não me podem passar despercebidos.
Atrevo-me a dizer, que há imagens perfeitas de tão imperfeitas...há imagens límpidas de tão sujas.
Há beleza, onde parece haver vazio.
Há uma essência muito bonita, que caracteriza este povo, estas terras, esta forma de viver.No seu jeito ainda rudimentar, brindam-nos com as mais castiças formas de ser e estar.Não há igual.Não há comparação.É uma cultura tão forte...tão definida, tão profunda.E pergunto-me que cultura não o será?
Esta cultura, este povo, estas pessoas, estas vida, que me tocam...ficam.Criam raízes em nós.
Detenho-me a observar, mesmo no meu jeito vivo e constantemente dou comigo a fazer isso mesmo, a contemplar.
Contemplo,desde o momento em que saio de casa, percorro o mesmo percurso, que apesar disso nunca é igual...porque os rostos mudam, as cores mudam...o tom do dia muda.
A rotina existe, mas não cansa, não mói.Aqui respira-se liberdade.E quando o cansaço é físico, há qualquer outra coisa...que nos anima.Porque estamos juntos e isso basta.
O dia corre e eu vejo-os brincar, livres, felizes, com aquilo que há...inventando novas formas de sonhar.
E até ao momento em que me deito, ouvindo os grilos lá fora...sentindo a noite,lembrando-me do que foi o meu dia, eu contemplo.Tomo consciência do que me fui tornando por causa deles...e no que eles se podem tornar por minha causa.Nessa diferença que ambos fazemos na vida uns dos outros.
Para mim, os melhores professores, foram estes meninos guerreiros, corajosos, feitos para suportar o que metade do mundo, não imagina ser possível.
E eles são...a parte mais bonita, destes olhos da alma.
Porque apesar de tudo, sorriem...e é isso que eu nunca vou deixar de fazer.