sábado, 16 de junho de 2012

O frio chegou ao Niassa














Este ano Moçambique, tem sido uma aventura.
Daquelas que dão voltas e mais voltas, mas que um dia me vão fazer sentir imensamente feliz, por ter mais uma vez, vivido tudo, com entusiasmo e sentido uma enorme aprendizagem.Confirmo a força que me habita a cada dia.
Os meus meninos, estão agora a ler como gente grande.Um esforço desde Fevereiro...com muita paciência, vieram para as minhas mãos, não sabiam nada.É motivo de imensa satisfação, para mim, perceber que, com 5 anos, sabem mais do que muitos adultos, para além de todas as regras que assimilaram e já seguem naturalmente.Há laços, que se intensificaram, outros que se desvaneceram...faz parte da vida.
Os pais, têm agora uma mais próxima e confiante relação comigo, o que me ajuda a entender melhor cada criança.Ficaram também aliviados por ficar em Lichinga e não ter ido embora.E vêm agora a falta de espírito de equipa...este ano.Mas sabem que desde o ano passado, o meu trabalho e relação com toda a escola é a mesma e cada vez é mais forte.E nada vai mudar isso.
Sentir esta confiança é tão importante.
O frio chegou finalmente ao Niassa.As madrugadas são assoladas por ventanias e as manhãs, bem como as noites, são imensamente frias.
As roupas de Verão, que outrora me caiam leves...agora ficam arrumadas num canto...á espera de melhores dias.E as poucas roupas quentes e de meia estação que trouxe comigo, são usadas quase diariamente, repetidamente.
Uma vez que dei metade das minhas coisas quando pensei, erradamente, ir embora para Portugal...tenho agora muito menos coisas e é bem melhor assim, pois por aqui uma vida simples e desprendida de alguns bens materiais não nos faz mal nenhum.
Na escolinha, as sandálias dão lugar ás botas, os vestidos dão lugar a casacos felpudos e os lenços, dão lugar a gorros de lã.Há quem use luvas e cachecol.Engana-se quem pensa que em África é sempre quente.Aqui existem somente 2 estações, Inverno e Verão.Dividem-se por 6 meses cada uma.O Verão, sim é muito quente, mas o Inverno esse também se faz sentir,não tão acentuadamente como na Europa.
Esta província é aliás a mais fria de todas.A que está mais a norte.E a mais esquecida também, dizem.Esquecida pelos governantes e onde um certo desenvolvimento tarda em chegar, confesso.
É um progresso lento e gradual ao qual tenho assistido.Por exemplo, este ano circulam na cidade 2 autocarros, que fazem assim a rede de transportes públicos da cidade de Lichinga.
Dois autocarros.É pouco claro, mas é alguma coisa, inspira vontade de evolução.Um nova rede de telemóveis, faz assim com que sejam 3 as operadoras presentes na cidade.Aos poucos, aqui e ali, nota-se o brotar de iniciativas.Há ainda um longo caminho a percorrer.
E por este motivo, ás vezes penso, que era aqui que eu tinha que vir parar.Nunca me imaginei em locais perfeitos, onde tudo está feito e conquistado á partida.Sempre vivi em cidades imperfeitas.Onde há algo por mudar e melhorar.Recordo a cidade de Bucareste, imperfeita, mas única e mágica, onde as pessoas eram de um calor humano que me acolheu 6 meses.Recordo a Turquia, a cidade de Ankara, movimentada, frenética, puro betão armado, mas onde vivi momentos extraordinários.No fundo, são as pessoas que fazem os locais e tudo o que é menos bom, passa a ser de certa forma invisivél aos nossos olhos.Porque tudo o que precisamos está dentro de cada pessoa,com quem nos cruzamos.É preciso estar atento.
E é assim que me sinto bem, é assim que encontro mais sentido em tudo.É assim que sou feliz.Porque também eu, imperfeita como ser humano, luto diariamente por ser melhor e tornar melhor o local onde me encontro.E para isso não é preciso muito...quantas vezes basta um simples sorriso, uma brincadeira, um alento ou apenas estar ali.E é um facto, que ás vezes também não consigo.
É isso que vou fazendo...levando a vida para a frente.Mesmo com este frio, o calor que me queima por dentro, não me deixa abrandar o ritmo, a alegria, a força de estar e viver no meio de um povo que amo.
Dia  após dia.Assim mesmo, num looping de emoções.


 Nem poderia eu...viver de outra maneira.

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