"Se esta rua, fosse minha, eu mandava-a ladrilhar, só para o meu amor passar." diz a canção dos Orquestrada...
E o meu amor, passa mesmo por aqui.
E esta rua é mesmo minha...é aqui que eu vivo, já lá vão 8 meses e viverei mais 6.
Por aqui, estão gravados momentos que vou guardar para sempre.Nesta rua, aconteceu, acontece e vai ainda acontecer, tanta magia.Sempre que eu queira.Melhor ainda é quando acontece inesperadamente.
O simples facto de acordar todos os dias e olhar lá para fora, para ver como está o tempo...e logo me aperceber do movimento de capulanas que se cruzam coloridas, de crianças vestidas de azul (uniforme escolar...) que correm para a escola, só isto já a torna especial.Logo penso, o quanto desejei estar aqui e como é bom que esta rua seja, a minha.
Desde as tardes de conversa nas escadas,desde os almoços e jantares no alpendre,desde as entradas em casa carregada de compras ao simples sair cá fora,apenas para respirar ou sentir como flui o movimento e a luz do fim do dia.
Esta rua, é calma, mas nem sempre.Gosto desse contraste que por vezes acontece.Depende dos dias.As noites, essas são tranquilas.
É perfeita para mim.Com cada buraco, cada árvore...a minha rua.
E na minha janela...aparecem sempre surpresas.
As melhores, para além de alguns pássaros que cantam e borboletas que de cores estonteantes,são a visitas quem rompem pelo quintal aos gritos:"Tia Riiiiitaaa!!!!Titia..." e só se calam, quando abro a cortina e lhes dou atenção.
Vêm em busca de brincadeira, risos, cantigas e no tempo dos maracujás, de levar uns quantos, mesmo que ainda estejam amargos.
Só o subir á árvore é uma aventura, que não podem deixar de viver.
Estes meninos não me arrancam só risos,mas sobretudo sorrisos.São uns castiços ao ponto máximo.
É de cair para o chão, de tanto rir.Cantam na janela...rebolam no chão, pedem mais uma foto...e um beijinho, mais um abraço, uma gargalhada, querem aprender a dançar,perguntam o impensável.
São crianças.São livres.São felizes.É por isso que no meio deles...sou eternamente criança também.
E feliz.E livre.Será que algum dia vou conseguir deixar de o ser?Conheço a resposta, faz tempo.
Quando olho para eles, a sorrir, penso nisso.Penso que no seu mundo, tudo é tão simples.Nada se complica.Nada fica por dizer.
Hoje, quiseram acompanhar-me até ao mercado.Ia eu, pelas ruas, com uma fila de konguitos atrás de mim...como se eu fosse a mãe.A mais pequenina, pela mão.Lembro-me que em todas as lojas que conhecia alguém, parámos para cantar.
E o efeito foi mesmo esse, deixar por onde passávamos, sorrisos.Lá mergulhei no mercado com todos eles...precisava de côco, farinha e óleo.Os olhos deles por trás das bancas...a apreciar cada movimento meu.Parámos mil vezes, para ver as capulanas, as missangas para trancinhas, os doces...um mundo ali dentro.A ansiedade deles e a disputa,para poder ajudar a carregar os sacos.
E finalmente, no regresso a casa...chegámos á esquina onde nos separamos.Eles para o bairro e eu para casa.
Depois de 1000 beijinhos, abraços e brincadeiras...
Disseram-me:"Tia Rita, até amanhã...havemos de vir na tua casa, de novo."
Respondi:"Ok.Vou esperar.Vou ter saudades de vos ouvir gritar!"
Eles:"Vai ter saudades, nossas??Tchiii Mentira..."
Eu:"Saudades, sim.E vou ficar triste...só de ir este bocadinho sozinha, até casa."
Eles:"Havemos de vir...porque tu nos animas titia!"
Eu:"..."
Não fui capaz de dizer mais nada.
Ouvir isto, no fim de um dia...no fim de alguns meses conturbados, por diversas razões, é tão bom.
Continuei o meu caminho até casa, devagar e em silêncio.
Até agora, estou a pensar nisto.A vida inteira, hei-de pensar.
E se querem que vos diga, o sentimento ainda que por escassos metros,foi o de vazio, fiquei mais triste sem eles...ali ao meu lado a gingar de xinelos no pé.E as saudades, essas também são reais.
Mal posso esperar que chegue amanhã...para os ver de novo pendurados na janela, chamando-me, para ser criança.
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