quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010




“Teu Pai, que vê o que está oculto,
te dará a recompensa”.
Mt 6, 6




No princípio, cinzas

              "Ao pensar em cinzas vejo, em primeiro lugar, os rostos fantasmagóricos do 11 de Setembro após a destruição das torres gémeas em Nova Iorque. Ou, mais recentemente, os escombros de Port-au-Prince, no Haiti, e os rostos angustiados de tantas crianças. São um limite, as cinzas. Uma fronteira, da qual é difícil ou impossível voltar. São a destruição a revelar como a matéria é frágil e passageira. São o mistério do tempo que transforma em aparente nada aquilo que se julgou tudo. E entre o nada e o tudo cá vamos escrevendo o existir, criando e recriando, na esperança de que o que é verdadeiramente importante nunca será cinza, antes estrela!


           Nestas terras das Beiras, onde é sempre tão bom voltar, mesmo quando o lume se apaga, e fica o “borralho”, às vezes, encontram-se brasas que são como sementes para outros fogos. Basta um sopro para as avivar, e um pouco mais de lenha para tudo se reacender. E das cinzas se faz adubo para a terra que irá acolher as sementes. E também barrela para branquear a roupa. Há um fogo que permanece vivo até nas cinzas. 


           Começamos a Quaresma com o sinal das cinzas. E um outro, tão idêntico, se seguirá: o deserto. O primeiro, sinal de um fim; o segundo, lugar onde o fim parece o mais provável. E, contudo, também é possível encontrar vida e beleza no deserto. Bastaria lembrar a deliciosa frase do Principezinho: “O que torna belo o deserto, é que ele esconde um poço em qualquer lado…” Há um caminho a percorrer a partir de novas cinzas e por novos desertos. Um caminho que nos chama a vencer a instalação e o desencanto, os erros passados e os medos futuros. Que pede para olhar cada fim como um novo princípio, cada derrota como uma sabedoria adquirida. A derrota que se chama pecado e também desilusão, a derrota que se chama doença, e também desemprego, e até injustiça. A derrota feita por mim e aquela que outros teimam em fazer. Como cinzas que se espalham no caminho. Espalham-se porque caminho. E caminho acompanhado.


           É preciso não esquecer a condição original de sermos moldados a partir da terra pelas mãos hábeis e ternas de Deus. E, por isso, receber este pedaço de cinza sobre a cabeça, reclama reacender o fogo. É cinza que não é fim, mas princípio. E quantos princípios estão desejos de começar em nós? E à nossa volta? E nas comunidades, também às vezes cinzentas, a que dizemos pertencer? Que princípio de fogo traz para mim a cinza deste dia?"        


As palavras são do Pa.Vitor Gonçalves e fazem todo o sentido.Recebo-as sempre pela Isabel Machinho e hoje tocam-me de forma especial.Hoje que também eu recebi estas cinzas e tudo o que mais desejo é recomeçar cheia de esperança.


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