quarta-feira, 8 de agosto de 2007

E dias antes de Partir...











Os sonhos e as quimeras estavam guardados no meu bolso, como se fossem rebuçados.


Podia tocar-lhes e pensar que mais tarde provaria aquelas doçuras, tinha-as ali à espera que a minha língua se enrolasse nelas.


Depois colar-se-iam no céu da boca, escorrendo sucos encantadores.


Ainda que eu, todos os dias, desenrrolasse um sonho, pequeno ou grande...


Caminhava pela rua, com algumas flores frescas debaixo do braço, para as pôr no meu quarto, gosto delas frescas e tavam a bom preço...


Ia assim um pouco encalorada pelas 17h de mais um dia quente de Agosto, mas sabia-me bem e os passos eram silenciosos nas sandálias rasas de sola mole, presas por fitas verdes de pele.


Sentia que fazia parte da quietude daquela tarde, ainda tão quente, de uma semana que não passava nunca mais.


Passado o portão, desse enorme jardim de recordações, entregue ao arvoredo frondoso e fresco, embrenhei-me solitária de desejos inexplicáveis, e apressava o andamento, o saibro vermelho a gemer sob os meus pés.

Muitos por ali se refugiavam...e permaneciam.


Sentei-me num muro de pedra e abri o meu bloco da aldeia de pedra...escrevi apenas isto: «Não sei saber» e «não sei ser daqui» - caminhos cegos onde fechei os olhos mas não pude, mesmo assim, ver.


Estava a ser sugada para longe. Longe das árvores, das palavras impressas ou por mim escritas, do calor; longe de mim.


Tirei um sonho do bolso e provei-o, ávida de ser.


Era de um amargor arguto, sabia a medos subtis e o bloco fechou-se nas minhas mãos e eu deixei-me escorregar até sentir os pés no chão.


Nem todos os sonhos são doces.


Recomecei a andar, enquanto o sonho azedo derretia na minha boca, e entrei na casa de chá, que há anos, frequento...


Bebi tília a escaldar e comi uma fatia de bolo de chocolate. Não havia mais ninguém com quem sorrir.


E não havia porque aquele momento era meu e precisava dele.



Fiquei ali, a regressar a mim, devagarinho.

Regressei a casa, dei de beber ás flores...e mirei-as em cima da cómoda, como se ali pertencessem desde sempre.

E depois, ritual sagrado...sentei-me para escrever e encerrar...ou ver nascer?

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