sábado, 16 de junho de 2007







Do alto do meu leito...sonhei.
















Hoje não era preciso fazer a mala depressa, pois não tinha gente à espera, mas não era fácil escolher as coisas certas para fazer, e ocupar os silêncios que traziam ecos de tanta alegria.
Quase sempre escondida no seu mundo de viagens ao centro de tudo, hoje ela estava prestes a ser devorada por esse mesmo mundo, por essa mesma vontade de partir e ir mais longe.

Acordara tarde e do alto dos seus sonhos e do seu leito, ela, só pensava nisso, não era capaz de se concentrar nos livros que tinha para ler, nas roupas para arrumar, na pressa em almoçar e começar um novo dia,em casa. Havia a mão protectora da sua mãe que tantas vezes a guiava e foi dando a sua ajuda, fazendo-a separar peças, objectos, algunas dos quais mais tarde havia de se perguntar porque os tinha?Hão-de fazer algum sentido...
Remexer nas nossas coisas trará sempre estes ecos felizes e menos felizes.
Sabia que faria sentido guardar tudo, tinha esse sentimento estranho.
Às vezes um velho amigo surge inesperadamente no nosso caminho, como uma estrela que, tendo estado sempre ali, brilha de súbito mais do que as outras e voltamos a olhá-la, surpreendidos.
Traz alívio. Traz sobressaltos desejáveis. Faz-nos redimensionar-nos, deitar fora as pequenas dúvidas que fomos assumindo para nós próprios, porque traz consigo a nossa imagem pura, verdadeira.
E leva-nos, como se soubesse perfeitamente que precisamos que nos leve a algum lado... ou a lado nenhum, desde que nos leve.
E tu apareceste assim. E levaste-me.Tudo isto, eu pensava sentada ao teu lado enquanto, conduzias.
Não se viam havia uns dois séculos. Tantas conversas para ter, tanta confiança para lhe falar, como se viessem de um até amanhã pronunciado na véspera.
Diferentes que estamos, e o nosso afecto dispensa afinidades.
Estava calor e uma luz imensa, que cegava. Era boa, a cegueira momentânea, e a conversa simples, tão simples, quase um bálsamo para a sua alma cheia de cansaços.
Havia muitas coisas, incontáveis, como o agora não posso falar mais, vou desligar; e a resposta que ficara por dar:- mas quem pediu para falar mais? Eu não quero falar mais.
E também o amor, tanto amor, que lhe metia medo.
Fugia de se apegar, escapava-se sempre, tinha a certeza de que seria muito complicado, depois, recuperar-se a si mesma, se o amor não durasse sempre.
E nunca vira um amor que durasse sempre, nem acreditava que houvesse um, e dava consigo mesma a desejar uma coisa em que não acreditava.
Talvez porque era precisamente esse o paradoxo que reinava na sua vida - ela dava e recebia amor eterno.
Sentia que isso era verdade, vivia-o há muito tempo e não precisava da eternidade para ir confirmando o eterno, que é algo que se reconhece como uma cor, está presente desde o princípio, sabe-se.
O meu lugar é aqui, o meu lugar és tu. Sim, ela sabia que sim.
E duvidava. Duvidaria sempre.
Este meu quarto é o pequeno palácio de uma pequena princesa que sonha sem fim.Oh, mas que bom, que bom...!
Os sonos devem ser especialmente repousantes no lugar onde costuma dormir uma criança.E eu considero-me uma, porque tenho muitas dentro de mim.
Pensava assim, embora soubesse que também podia ser o inverso. Lembrava-se dos pesadelos que tinha quando era muito pequena.
Está cheio de livros infantis, bonecas de pano e a cama é uma casinha de madeira para onde terás de subir por uma escadita.
Pensou no seu castelo de luz e cheio de Duendes, que adorava. E sorriu.
O palácio da princesa far-lhe-ia bem, apenas por uns dias. Ali dormiria cem anos como a bela adormecida, impossível de acordar senão pelo beijo do verdadeiro amor. Talvez dormisse para sempre. Talvez muito pouco.
Sorriu outra vez, enquanto pensava que, depois de cair no sono, isso... seria indiferente.

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